Meu deus é maior que o seu e somente a minha religião salva!
O artigo 5° da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 dispõe que "é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, proteção aos locais de culto e a suas liturgias.". Na teoria, tudo é muito belo, mas, na prática, um governo que se diz laico (onde não se misturam religião e política), prefere elevar as ideologias de uma determinada crença (e ser controlado por ela), permitindo o desrespeito e a violação do direito de não crer e de ter crenças diferentes.
Não podemos dizer que é errado considerar a sua religião como a “única verdadeira”, pois cada um deve crer no que preferir. O que não pode ser aceito, é que tentem impor sua crença às pessoas que não creem no mesmo que você, pois a sociedade é formada por pessoas de diversas crenças e de nenhuma.
Algumas pessoas desrespeitam as outras religiões em nome da sua própria e isto é inaceitável. Católicos desrespeitam judeus, que desrespeitam mulçumanos, que desrespeitam protestantes, que desrespeitam espíritas, que desrespeitam... E a lista não tem fim, mas pelo menos, não são todos os seguidores que desrespeitam as crenças diferentes, e isso já é um grande passo.
Vários mulçumanos são vistos como terroristas, apenas por que alguns mulçumanos são terroristas, e isso se agravou após o estouro da guerra contra Muamar Kadafi; muitos crentes (que creem em algo) vêem os ateus como o que há de pior na sociedade, associando a descrença com a capacidade de cometer crimes, quando, na verdade, qualquer pessoa, independente de suas crenças, é capaz de cometer crimes, sendo que nenhum deles é feito com tanto prazer do que quando em nome de um preceito religioso!
Algumas correntes que pregam o ‘amor ao próximo’, na verdade, reduzem o significado de ‘próximo’ ao de ‘proximidade’, ou seja, dirigem seu ‘amor ao próximo’ somente aos membros de sua congregação, criando um sólido preconceito, que é o de se dirigir as pessoas que não pertencem ao seu meio como sendo “pessoas do mundo” e culpando-as pelos males da sociedade, além de proclamar que toda e qualquer outra forma de crer está errada, e chegando até mesmo a criar tribunais para intimidar, torturar e matar quem ousar desafiar.
No Oriente Médio, seguidores de religiões que acreditam em um mesmo deus e apenas seguem leis diferentes para chegar até Ele, e que afirmam sua raiz em um mesmo patriarca, se contradizem em não reconhecerem suas semelhanças, que, quando admitirem, poderão, finalmente, por fim na guerra bélico-religiosa fortemente apoiada e sustentada pelo Gigante do Norte.
Será possível, que, em meio a toda essa loucura, existe alguém que é capaz de enxergar a razão? Mas, o que seria esta razão? Será possível, que ninguém perceba que todos são ateus com os deuses dos outros? E que para os seguidores de uma religião, os seguidores de uma outra são infiéis, e vice-versa?
Tenha orgulho de crer ou de não crer em algo, mas nunca imponha o que você acredita ao o que os outros tem o direito de acreditar.
“A melhor religião é aquela que te faz melhor. O que ter faz melhor? Aquilo que te faz mais compassivo, aquilo que te faz mais sensível, mais desapegado, mais amoroso, mais humanitário, mais responsável... A que conseguir fazer isso de ti é a melhor religião.”
Tenzin Gyatzo, o Dalai Lama
Moldura
Quando decidi escrever esse texto divido em três partes, pretendia fazer um retrato do mundo onde vivo. E a forma como mostrei esse mundo, infelizmente, é real.
O ser humano, em menos de quatrocentos anos, conseguiu destruir o planeta, algo que nem os dinossauros, que viveram por muito mais tempo, conseguiram fazer. Mas, mesmo antes de aprender a destruir a Terra, já era mestre em destruir a si mesmo. O ser humano é o único ser em toda a escala animal, que faz guerras, destrói o que estiver em seu caminho, mata mas não come (exceto raras exceções) e causa segregações entre seus semelhantes. Talvez, possa-se dizer que qualquer outro ser vivo é mais civilizado do que o próprio ser humano. Mas, agora que fiz o retrato, preciso expor a moldura.
É doloroso saber que as pessoas no Brasil não sabem utilizar corretamente o direito-obrigação de votar, elegendo candidatos preconceituosos e que abusam de certa ‘imunidade parlamentar’, como é o caso do deputado federal Jair Bolsonaro que, eu não sei por que, mas é membro da Comissão dos Direitos Humanos e Minorias. Ele, em entrevista ao programa CQC, associou o fato de uma pessoa ser negra a promiscuidade, mas, em entrevistas para os jornais, afirmou ter confundido a pergunta feita pela cantora Preta Gil, que havia lhe perguntado qual seria sua atitude se um de seus filhos namorasse uma mulher negra. O deputado alegou pensar que a pergunta se referia à homossexualidade, e mostrou que não quer nada com a democracia, ao declarar “ter imunidade para falar e para roubar”, ser contra homossexuais frequentarem escolas, e afirmando que as pessoas se tornam homossexuais devido a uma má educação e a pais ausentes. Visto que muitas crianças são abandonadas ou criadas apenas pelas mães, Bolsonaro dá a entender que o Brasil é um país onde só tem gay!
Também é doloroso ver um líder religioso e também deputado, usar a rede social twitter para postar afirmações racistas e, ainda por cima, utilizar um livro sagrado para justificar suas afirmações, como é o caso do pastor Marco Feliciano, que postou em seu twitter que “os africanos descendem de ancestral amaldiçoado por Noé” e que “a podridão dos sentimentos homoafetivos levam ao ódio, ao crime, a rejeição”.
Mas, não são somente eles que fazem parte dessa moldura. Qualquer pessoa que é capaz de criar preconceitos, de violar o direito de algumas pessoas existirem, de virar as costas diante do sofrimento alheio e de se considerar superior devido a diferenças sexuais, étnicas, regionais, ideológicas ou de qualquer outro tipo, faz parte dessa moldura. Portanto, como qualquer pessoa é capaz de tudo isso, todas fazem parte dessa moldura. Você que está lendo isso, as pessoas que estiverem por perto, as que estiverem distantes, as que você conhece, as que você não conhece, e até mesmo eu, fazemos parte dessa moldura.
A moldura a que me refiro, é a estupidez humana. E dessa estupidez, todos fazemos parte. É esta condição que sustenta os preconceitos e, talvez por isso, esse retrato sempre estará incompleto.